A obrigação alimentar do espólio só pode ser
invocada se já foi estabelecida anteriormente ao falecimento do autor
da herança – por acordo ou sentença judicial. Com esse entendimento, a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido de uma
presidiária que pretendia receber pensão alimentícia do espólio de seus
pais – cuja morte foi ordenada por ela. A presa pedia a pensão para
atender suas necessidades no presídio de Tremembé, no interior de São
Paulo.
De forma unânime, o colegiado seguiu o entendimento do
relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, que destacou ainda, em
seu voto, a maioridade da autora e a extinção do poder familiar.
O
ministro observou que a ação de alimentos foi ajuizada em 2007, na
vigência do Código Civil de 2002, e que a autora nasceu em novembro de
1983. Portanto, já havia alcançado a maioridade e, em consequência,
estava extinto o poder familiar.
Auxílio material
Em
seu pedido, a presidiária afirmou que sofre “descaso” e se encontra em
situação de total abandono, buscando amparo emocional e financeiro em
seus advogados, por isso necessitaria de “alimentos para atender suas
necessidades, voltadas à aquisição de artigos de higiene, roupas,
medicamentos prescritos por profissionais do presídio, alimentos
propriamente ditos, vez que a falta de visita impede essa dádiva, além
de materiais para propiciar o desenvolvimento de atividades
laborterápicas”.
A autora foi condenada a 38 anos de reclusão
pelo envolvimento no homicídio dos pais. Os assassinatos foram
planejados por ela e executados pelo seu namorado à época e pelo irmão
dele.
O juízo da 1ª Vara da Comarca de Tremembé julgou extinto o
processo, sem resolução de mérito, por entender que os alimentos têm
caráter personalíssimo.
O Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJSP) negou o recurso da defesa da presidiária, ao entendimento de que a
obrigação do herdeiro em continuar pagando os alimentos só existe se a
pensão já estiver fixada no momento da morte.
Poder familiar
No
STJ, a defesa sustentou que não é adequado o entendimento do tribunal
estadual acerca de não haver legitimidade passiva do espólio, por não se
tratar de encargo preexistente, assim como por não se tratar de filho
menor ou cônjuge dependente, pois a presidiária não possuía renda
própria, tampouco exercia trabalho remunerado ou estágio, por ocasião da
morte de seus pais.
Ainda em seu voto, o ministro Salomão fez o
registro de que a autora foi declarada indigna, com exclusão da
herança, em sentença prolatada pela 1ª Vara de Família do Foro Regional
de Santo Amaro (SP).
“A própria recorrente deixa nítido que é
notório o crime em razão do qual está encarcerada. Por isso, apenas a
título de realce, por não ser matéria apreciada pelas instâncias
ordinárias, é bem de ver que a admissão da transmissão do dever jurídico
em abstrato de prover alimentos ensejaria a teratológica e injusta
situação de propiciar que herdeiros, que incorram em uma das situações
de indignidade previstas nos incisos do artigo 1.814 do CC/2002, por via
transversa, alcancem os bens deixados pelo de cujus”, concluiu o relator.
Por
fim, o ministro Luis Felipe Salomão lembrou que o artigo 1.695 do
CC/2002 dispõe que “são devidos alimentos quando quem os pretende não
tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, a própria
mantença”.
“O preso tem direito à alimentação suficiente,
assistência material, à saúde e ao vestuário e, como visto, a concessão
de alimentos demanda a constatação ou presunção legal de necessidade
daquele que vindica alimentos. Entretanto, na inicial, em nenhum momento
a autora afirma ter buscado trabalhar durante o período em que se
encontra reclusa, não obstante a atribuição de trabalho e sua
remuneração sejam, simultaneamente, um direito e um dever do preso”,
concluiu Salomão.
Projeto de lei
O
ministro destacou também que o Projeto de Lei 61, de 2009, já aprovado
no âmbito do Senado Federal, de autoria do senador Expedito Junior,
propõe a modificação da redação do artigo 1.700 do Código Civil para,
nas palavras do seu autor, “que não se perpetue a impropriedade de
cobrar-se pensão alimentícia do morto ou do espólio de seus bens”.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Fonte: http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=113229